Capítulo 3
Acordei no outro dia, uma segunda feira chuvosa e fria - para os outros, pelo menos. Não tinha comido o veado no domingo anterior, então minha fome tinha aumentado ligeiramente.
Eu aguentaria ficar até um mês sem dormir, mas a pressão da dúvida me deixava mentalmente cansado.
Eu segui até o espelho do meu quarto. Minha pele era morena, meus olhos eram castanho-amarelos, meu cabelo era preto, liso e curto. Meu corpo era musculoso e alto.
Na verdade, eu sabia que eu era um animal, forte, cheio de vida e guiado por instinto. Mas eu também sempre fui muito religioso, e acreditava que se eu pudesse me conter, não matando seres humanos, eu seria salvo, teria uma vida melhor; enfim, eu creio... Aliás, só nos transformamos por vontade própria ou quando nosso instinto nos ordena, mas isso só depois do crepúsculo, segundo me ensinaram.
Depois de pensar por longos segundos, fui tomar banho e me vestir.
Meus "primos" e meu irmão de criação acabaram de se arrumar para irmos a Toronto Independent High School, o colégio no qual todos nós estudávamos. Levávamos 15 minutos para chegar lá - Jensen nos levava na Routan vermelha dele.
Já no colégio, eu me sentei em um banco e esperei até o sinal tocar. Adorava repassar o conteúdo a ser estudado no dia. Eu era meio nerd, mas nunca sofri nenhum tipo de bullying por isso.
Quando o sinal soou, eu segui para a aula de Física, no prédio C. Ao entrar lá, tive uma enorme surpresa.
Ele estava lá.
Dean, o meu perturbador interno, estava sentado em frente ao meu lugar, lendo um livro em silêncio. O Professor se aproximava, eu ouvia seus passos ao longe no corredor.
Sentei-me no meu lugar. O cheiro dele ainda era de fome e amizade.
Foi então que o professor entrou e mandou formar grupos. Eu sempre era excluído porque sempre havia grupos prontos entre todos. Mas outra pessoa também fora excluída...
- Sr. Wolf, sente-se com o Sr. Winchester! - sugeriu o professor. E eu o fiz.
- Oi. - disse Dean, ligeiramente tímido. Só agora eu vi que o cabelo dele na verdade era loiro escuro. Seus olhos eram mesmo verdes, muito claros. Mas seu cheiro ainda estava lá, me atormentando.
- Oi. - respondi, com a mesma timidez e me contendo para não atacar. Era fácil, mas ia contra meus instintos.
Percebi que ele realmente seria um ótimo lobisomem. Tinha um porte tão atlético e parecia ser resistente. Mas eu não podia transformá-lo; não sem ele querer realmente. Ah, o Canadá: cheio de pessoas chamativas e que me fazem decidir entre destruir a vida delas.
- E aí? Onde vai ser? - perguntou Dean.
- Onde vai ser o quê? - perguntei, não entendendo.
- O trabalho, ou pode ser aqui na escola mesmo?
- Que trabalho?
- O trabalho de Física que o professor acabou de passar, sobre óptica.
- E o grupo somos nós, certo?
- Sim...
Eu estava muito distraído para prestar atenção no professor.
- Ah, não dá para eu vir para cá, porque minha casa fica meio longe, na saída oeste. - eu disse, sorrindo.
- Ok, se você deixar, eu podia ir à sua casa depois da aula. - disse Dean.
- Mas até acabarmos já vai estar bem tarde...
- E daí? Eu sou órfão, moro sozinho. Sabe, meus pais me deixaram uma herança bastante vantajosa, então, não preciso me preocupar com dinheiro para táxi ou algo assim...
Se antes a tentação já era grande, agora ficou pior. Farejei algo doce no ar, bem de leve, vindo da janela aberta. Olhei em direção à janela e o que vi me deixou pior: três vampiros observavam o colégio no estacionamento. Pareciam procurar algo, talvez farejando. Era Caius, e outros dois vampiros mais jovens, também parte dos Volturi, com certeza. Rapidamente saíram correndo em direção a um carro, entraram e deram partida.
Eu os vi por um instante, o suficiente para fixar os rostos deles em minha mente. Vampiros, não são nada mais do que mortos andantes. E foi o fato de ver aqueles mortos andantes que desencadeou os eventos seguintes. Fui tomado pela raiva e comecei a arfar; algo estranho estava acontecendo, algo que só acontecia quando eu me transformava. Mas, ainda não era noite...
- Está tudo bem com você? – perguntou Dean.
Eu mal tive tempo para responder. Saí da sala, aproveitando que o professor não se achava presente, e corri em direção ao banheiro masculino. Felizmente, ninguém estava lá...
“TEM ALGO ESTRANHO ACONTECENDO. EU ACHO QUE ESTOU ME TRANSFOR-MANDO... POR FAVOR, AJUDEM!” – digitei a mensagem no meu celular e mandei para todos da minha alcatéia.
Mas era verdade, eu estava me transformando. Eu ouvia meus ossos estalarem, sentia meu corpo se alongando...
- Max, o que está acontecendo? – perguntou Dean, entrando no banheiro depois de mim.
Eu mal tive tempo de me virar. Talvez tenha sido a má alimentação da noite anterior ou a pressão por causa de Dean ou a raiva por ter visto os vampiros, ou os três fatores juntos, mas eu me transformei, em plena luz do dia.
Meus pés foram se alongando e enrijecendo; meus braços ficaram mais longos; minhas unhas se tornaram garras; meu rosto se alongou e se tornou um focinho; meus dentes ficaram afiados e resistentes, assim como todos os outros ossos do meu corpo; minhas orelhas se alongaram e ficaram pontudas e subiram para mais alto na cabeça; meu corpo ficou coberto de pêlos... Enquanto isso, minhas roupas se rasgaram e Dean estava paralisado de terror.
Eu rosnei brevemente antes de avançar para cima dele e morder-lhe o braço direito. Ele começou a gritar, e foi quando minha alcatéia chegou. Separaram-me de Dean e me pressionaram num canto, segurando meu focinho para que eu não uivasse, e tapando a boca de Dean para que ele não gritasse.
Tão rapidamente quanto eu me transformei em licantropo, eu voltei à forma humana. Um momento de fúria, um segundo deixando sua mente vazia, um instante permitindo que o instinto tomasse conta...
- Vamos sair daqui, rápido. – disse Peter. Eu segurei minhas roupas rasgadas contra meu corpo e segui atrás deles, depois de perceber que Dean havia desmaiado.
Saímos correndo do colégio, e Jensen nos aguardava do lado de fora.
- Como... – comecei.
- Pergunte depois. – declarou ele.
Seguimos para minha casa. Colocaram Dean deitado no sofá da sala. A chuva começou a cair com mais intensidade do lado de fora.
- Como eu fiz aquilo? Ainda é dia, um lobisomem não pode se transformar durante o dia... – eu disse para Jensen, atordoado.
Ele me olhou como quem pedia perdão.
- Os mordidos realmente não podem... – respondeu ele.
Agora muitas coisas faziam sentido. Eu sempre achei que meu autocontrole fosse mais difícil que o dos outros, e ai estava o porque.
- Nascidos podem se transformar quando quiserem?
- Sim. Mas eu não queria te preocupar com isso. Quer dizer, você sempre conseguiu muito bem, eu achei que fosse funcionar como um placebo ou algo assim, e sempre funcionou. Você achava que só tinha que se controlar à noite, se precisasse, e durante o dia vivia normalmente, e sempre funcionou assim. Mas esse garoto mudou tudo. É algo do seu instinto, muito além do que você estava acostumado a suportar; você precisava mordê-lo... – disse Jensen.
- Mas, como eu vou viver agora que, sei lá, o placebo acabou? Eu não consigo me controlar durante todo o dia; eu mal conseguia fazê-lo à noite. – expliquei.
- Max, não percebe que isso é um dom? Um dom que você não deveria ter descoberto, não assim... Mas é um dom! Você vai aprender a viver com isso, tenho certeza.
- E se eu atacar todo mundo que eu ver pela frente? Eu aceito que eu sou um lobisomem, e agradeço a Deus por isso. Mas eu quero viver entre os humanos, fingir ser normal, ir ao cinema, fazer compras... Eu nunca nem fui a uma boate! Agora como eu vou saber se não vou atacá-los?
- Você sabe que tem o controle sobre sua transformação. Você decide quando vai ou não ir para a forma de licantropo. Você só foi pego de surpresa... Além disso, você não comeu direito, não dormiu direito, seu corpo entrou em colapso e desestruturou sua integridade, deixando-se guiar pela necessidade de morder o menino. Apenas isso. É só não sentir fome, desejo ou raiva que você não terá problemas. – detalhou Jensen.
- Ok, eu entendo, é como se eu não tivesse comido e desmaiado de fome... Mas você deveria ter me contado isso antes, Jensen.
- Eu sei, Max, perdão.
- E o Dean? – perguntei.
Todos nós olhamos para ele, deitado no sofá, inconsciente. Então ele começou a gemer e gritar, se contorcendo.
- Já começou... – percebi. Durante os próximos 5 dias, Dean seria consumido por uma dor congelante que o transformaria em lobisomem.
O veneno presente nos nossos dentes agia dessa forma, caso uma presa fugisse, para a pegarmos depois. Mas era mais uma forma de dar continuidade à espécie, já que criar um lobisomem por nascimento era extremamente raro. E quando tudo estivesse pronto, todos os cromossomos Y dele - por isso só homens eram lobisomens; cromossomos Y formam um lobisomem - estariam capacitados para ativar o DNA de licantropia e ele teria os instintos e sentidos de um lobo, além de uma força e resistência extraordinárias...
- Mas, não foi exatamente o Dean que me fez transformar. Eu vi Caius e outros dois vampiros no colégio. Antes que você pergunte: sim, eu tenho certeza. Eles brilhavam sob sol, e eu já vi seus desenhos de Caius. Era ele. Eu acho que estavam nos procurando... E não tenho motivos para discordar que nos encontraram. – conclui.
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